Quadrinhos: O que querem as mulheres?

Quando fui entrevistada pelo programa HQ&Cia, um dos espectadores me perguntou "Afinal, o que as mulheres querem no Quadrinhos?"(a pergunta foi seguida por um comentário meio estranho sobre Turma da Mônica Jovem, wth?)


'Garotas querem apenas direitos humanos fundamentais.'
Sacaram a referência?


Pois bem, meus amigos, vou dizer o que garotas querem: queremos representatividade e independência. Queremos personagens que sejam compatíveis com as mulheres do mundo real, não só em suas histórias, reações e atuação. Também queremos mulheres graficamente compatíveis. Não estou falando de tirar a graça de uma HQ por que ela parece irreal, mas que as HQ parem de reproduzir um estereótipo de corpo "perfeito" magérrimo, com cabelos longos e lisos e, sobretudo, caucasiano. A representatividade de mulheres de outras etnias, sobretudo negras, nos quadrinhos é quase nula! Os quadrinhos, principalmente os "comics americanos"( Dc, Marvel, etc) refletem exatamente nossa sociedade racista, classicista e machistinha do caralho. Mulheres servindo apenas como acessórios ou no velho modelo de "donzela em perigo". Não é isso que queremos. Queremos ser protagonistas, nos salvar por nós mesmas, cuidar uma das outras. Nada de ficar esperando os carinhas bombados salvarem a gente. O fato é que esse tipo de publicação é feita por homens e para homens. E não tem nada de errado em comprar revistinha do Batman ou ser super fã do Dead Pool, mas temos que fazer uma análise um pouco mais profunda das Hqs e ver em que aspectos elas reproduzem um sistema opressor. Não vou nem comentar sobre a homofobia e transfobia nos quadrinhos agora, mesmo por que pretendo dedicar um post só pra isso no futuro, aguardem. No fim, o que nos resta é correr para Hqs alternativas e auto biografadas para termos um pouco mais de visibilidade. Há até quem duvide que garotas realmente leem quadrinhos. (se você tem asco de mimimi e choradeira machista e preza pela sua sanidade mental, não leia os comentários) (sim, eu fui nos comentários vandalizar)

Queremos ler sobre problemas de mulheres de verdade: TPM, menstruação, relacionamento com a família, amigos e namoros (sejam eles hétero ou homoafetivos). Queremos ler sobre as experiências das mulheres na universidade e no mercado de trabalho. Queremos saber o que acontece com as mulheres que foram pra cadeia. Queremos a visão das mulheres em conflitos, em guerras, na geopolítica. Queremos dar voz à mulheres violentadas, exploradas. Queremos a visão do mundo na perspectiva feminina. Elas brancas, negras, orientais, muçulmanas, judias, freiras, enfim, tornar a HQ, assim como a literatura (ou qualquer tipo de arte), um instrumento libertador e também de denuncia.



Aline "Bunch" Komisky mostra a mulher real em seus relatos autobiográficos. 

A super-sexualização das mulheres nas HQS

A principal exigência como mulher fã de HQ é o fim da super-sexualização das mulheres. Quê? Calma, eu explico. Em muitas HQs, a mulher tem a sexualidade aflorada de um jeito absurdo, que não condiz com a realidade, ou então está presente apenas nos momentos que se relaciona com o herói. Não tem história, não tem identidade, em outras palavras, a mina só tá lá pra dar. Esse modelo de história é tão comum que a gente começa a duvidar que as empresas de Hq gostem das mulheres mesmo. Chegamos ao ápice de desenhar uma mulher nua cometendo suicídio ser tema pra concurso de contratação da DC


The Hawkeye Initiative é um site que mostra quão sexualizada as mulheres são nas HQS, colocando o Gavião Arqueiro nas mesmas poses e roupas para mostrar quão ridiculas e sexistas elas são.


Como nas HQs a imagem monta a história juntamente com o texto, podemos analisar a imagem das mulheres também: além do esteriótipos já citados, podemos também notar quão sexualizada a mulher é quanto suas roupas e poses. Já notaram que as garotas estão sempre com roupas absurdamente justas, que mais parecem pinturas corporais, exibindo um corpo magro com seios e bunda enormes, geralmente arrebitados em poses sensuais e, cá entre nós, bem difíceis de fazer quando você está lutando contra o crime. Não há nada de moralismo aqui, defendo a liberdade sexual da mulher com unhas e dentes, desde que essa seja autônoma, ou seja, esteja a serviço da mulher e não a mercê dos desejos de leitores punheteiros. Infelizmente, sabemos como o mercado funciona, mas gosto de pensar que as mulheres também compõe o mercado consumidor de HQs e devemos mostrar o que queremos.

Garotas no Mangá

 
Garotinhas 'Kawaii Desu'? Espere só quando a Bambi der um tiro na sua cara

Os mangás, estilo de HQ japonesa, traz com bastante frequência protagonistas femininas contando suas histórias. Os mangás são um grande incentivo às garotas se interessarem por Hqs e também de mostrarem seus trabalhos, visto que grande parte das 'mangakás' (autor de mangás) são garotas. Também há mangás que abordam o homossexualismo, ainda que de forma supersexualizada e até questões trangêneras e transexuais(tema de mais um post futuro) , temas tão delicados na sociedade tradicional japonesa. 

A nudez de Cinderalla, de Junko Mizuno, me fez me sentir muito mais confortável com meu corpo.


É uma pena que na maioria dos mangás (e animes, os desenhos animados oriundos desse tipo de HQ), as garotas ainda são vistas apenas como acessório decorativo ou sempre no estereótipo 'kawaii desu', ou seja, sempre fofinhas e infantilizadas, num eterno fetiche pelo jovial, ou também super-sexualizadas, como nas comics americanas. Alguns mangás realmente conseguem dar voz às mulheres em uma sociedade tão patriarcal e conservadora, que é a japonesa, e isso é um grande avanço mediante as mídias impressas de todo o mundo. Até nos mangás estilo "Garota Mágica" podemos encontrar elementos de conflito interno, psicológico, atrito com a sociedade e a relação das garotas com os que as cercam na vida cotidiana e escolar, principalmente os escrito por garotas. Ainda não refletem a realidade da maioria das meninas no mundo, mas é um ponto bem interessante a ser analisado.



Quadrinhos com protagonistas femininas que a Cla666 recomenda: 

Todos possuem versões brasileira e estão disponíveis em  livrarias e na internet.

  • Persépolis - Marjane Setrapi (autobiográfico)
  • Amo essa Bunch - Aline Kominsky (autobiográfico)
  • Deus, essa gostosa -  Rafael Campos Rocha (NACIONAL!)
  • Cinderalla - Junko Mizuno (mangá)
  • Fun Home - Alison Bechdel (autobiográfico)
  • Mulheres Alteradas - Maitena
  • Habibi - Craig Thompson ()
  • Bambi - Atsushi Kaneko (mangá)
  • O Fantasma de Anya - Vera Brosgol
  • Lucille - Debeurme Ludovic
  • Koko be good - Jen Wang
  • Kiki - Adão  Iturrusgarai (NACIONAL!)
  • Nana - Ai Yazawa (mangá)
  • Claymore - Norihiro Yagi  (mangá)
  • Uma patata com carinho - Chiquinha (NACIONAL!)
  • Kiki de Montparnasse -  Catel Muller e Jose-Luis Bocquet  (biográfico)
  • Aya de Yopougon -  Marguerite Abouet  e Clément Oubrerie
  • Colégio Feminino Bijinzaka - Mayumi Yokoyama (mangá)
  • XXX- Holic- Clamp  (mangá)

Acompanhem:



Espero que tenham gostado do texto e da lista! Em breve, mais post feministicos pra vocês!
Não esqueçam de curtir a página no feice book

Comente com o Facebook:

12 comentários:

  1. Ótimo post! É realmente lamentável como nós, mulheres, somos retratadas. Não só nos HQs, mas nos videogames, filmes... Dá até pra duvidar se esses autores conhecem mulheres de verdade

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Tá foda, né nega? Ser mulher é ter o mundo contra a gente o tempo todo em todos os seguimentos. Abordei na Hq por que é a matéria que tenho um pouco mais de domínio, mas, como citei no post anterior, o machismo tá impregnado em tudo!

      Excluir
  2. É só procurar um pouquinho mais que vocês acham quadrinhos americanos e até europeus que abordam o que vocês gostam uma dica: Estranhos no Paraíso.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Então para termos uma representação decente do nosso gênero, teremos que "procurar um pouquinho" para acharmos quadrinhos americanos e, quem sabe, até europeus?

      Não estamos procurando quadrinhos sobre povos alienígenas que vivem à base de enxofre. Ser tratada com respeito não é uma situação específica que temos que procurar até achar HQs mais alternativas, é algo que deveria ser regra em todo o mercado de HQs e mangás (bem como filmes, livros, etc.)

      Cla: eu fui dar uma olhada nesse link sobre os caras que duvidam da existência de meninas que lêem HQs. Eu não aguentei. É chorume demais. Fechei depois de uns dois minutos... argh.

      Excluir
    2. Quando digo procurar mais um pouquinho falo não ficar preso apenas a DC e Marvel e achar que todo esse é o mercado americano essas Editoras são especializadas em HQ´s de heróis e vão trazer aquele tipo estereotipado até nos heróis é assim são todos sarados geralmente tem muita grana ou é um deus, mas mesmo assim tem algumas personalidades nas heroínas que valem a pena como Lois Lane, Kitty Pride, Mulher invisível, Vampira.
      Editoras como Vertigo, Image Comics e outras que não são tão conhecidas publicam obras com temas mais adultos que para nós aqui não tem tanta expressão, mas nos EUA ganham até prêmios como a que citei Estranhos no Paraíso.
      É a mesma coisa no mercado japonês uma Shonen Jump da vida não vai publicar por exemplo um Seinen ou Shojo existem editoras especializadas nisso ai o problema está no mercado brasileiro que diversifica bem os mangás mas se tratando de HQ´s de outros mercados mantem um padrão Super Herói e de vez em nunca traz uma HQ mais séria.

      Excluir
    3. Amigo, mas é exatamente disso que o post trata: a raridade de Hqs que trazem as mulheres como protagonistas e contrapartida da maioria esmagadora das HQs com protagonistas masculinos. E, mesmo quando mulheres protagonizam, são mulheres que não correspondem com a realidade. HQs legais de mulheres são RARÍSSIMAS. A gente tem que PROCURAR, ou seja, não são abundantes.

      Agora, mulheres são 50% da população mundial. Nada mais justo que querermos ser representadas nas HQ. É pedir muito?

      Excluir
    4. Luna, eu fiquei mó feliz de você comentar aqui, obrigada ♥
      É foda esses mimimachinhos que acham que são donos do mercado de HQ (e do mundo) argumentando usando Big Bang Theory (??!!!) como fundamento. Chora aqui no meu ombro, chora ):

      Beijo ♥

      Excluir
  3. Seus argumentos são vazios na origem, quando ignoram totalmente a essência dos quadrinhos: são histórias fictícias, de super-heróis cheios de poderes sobrenaturais. Por acaso os indivíduos masculinos lá retratados são normais? Quantos sarados você encontra por dia vestidos em maiôs supercolantes e cuequinhas sexy, voando, soltando bolas de fogo e levantando milhares de toneladas? Seguindo sua linha de pensamento eu deveria ficar muito revoltado porque nunca colocam um homem normal, humano, como super-herói. Deveria me sentir humilhado e desrespeitado porque eu não tenho superpoderes e nos HQs são eles que pegam todas as mulheres. Da mesma forma, nas histórias o bem sempre vence, quando sabemos muito bem que no mundo real é o mal que prevalece, a desonestidade, a falta de caráter e de ética, o poder e o dinheiro. E convenhamos, desenhar homens e mulheres nas mesas poses para dizer que as mulheres são sexualizadas é outro argumento vazio. Faça o oposto e veja se mulheres ficam naturais nas poses dos heróis masculinos.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Você ignora o peso que o patriarcado adiciona à baixa representatividade feminina em qualquer mídia.

      Excluir
  4. Bem, essa é uma crítica bem plausível, por isso existem quadrinhos sem ser de super-herói que você pode comprar em qualquer livraria. Agora, pelo menos os homens tem representação em ambos os tipos de HQ, as mulheres nem isso.

    ResponderExcluir
  5. Olá, parabéns pelo post! Eu concordo com toda a sua elaboração muitissimo bem descrita. Entretanto, achei um tanto estranha a recomendação de "Deus essa gostosa". Bom, eu sou uma jovem negra, estudo hq numa abordagem feminista. Por esses motivos fiquei bastante empolgada ao saber duma hq sobre uma mulher negra no Brasil. Até aí tudo bem, mas a hq em vez de quebrar estereótipos apenas reafirma. A Deus é simplesmente objeto sexual, é tao sexualizada q nao faz/ pensa mais nada. E naquela imagem da menage, lembra? Ela aparece tão subalterna servindo de objeto de prazer das pessoas brancas!? Acho que o liberalismo sexual nao é o centro das reivindicações das mulheres negras, pois é sexo q se espera de nós. Eu acho que é das HQ mais racistas q já li.

    ResponderExcluir
  6. Exemplo rápido: O fato é que o super herói de roupa colada está desse jeito para representar a FORÇA, o PODER masculino através dos músculos e das poses de "macho alfa". Não se espera que o leitor faça seu fap diário com o Hulk, if you know what I mean.

    Enquanto a heroína (geralmente em um papel bem menor ou de pouca ação) está de roupa colada para mostrar seus atributos físicos femininos (seios grandes e empinados, glúteos definidos, cintura estreita, pernas longa e por aí vai), esbanjando apelo sexual APENAS. FAPFAPFAPFAPFAFAPFAPFAP.

    Corpo masculino = força.
    Corpo feminino = sexo.

    ResponderExcluir

Você Também deve Gostar de